O Plamurb já escreveu vários artigos refutando a falácia de que empresas como a Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) e, principalmente, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), são deficitárias e que a única solução é conceder a operação para o setor privado.
E também já escreveu outros textos mostrando detalhes das linhas operadas pela iniciativa privada que pouca gente conhece, como a Câmara de Compensação e os fatores urbanos que dão vantagem para a Linha 4-Amarela.
E olhando o balanço administrativo e financeiro da CPTM no ano de 2019, fica claro que a empresa pode sim ser autossustentável e que o modelo de concessão aplicado nas linhas 4-Amarela e 5-Lilás acaba lesando as duas estatais não permitindo que o desempenho seja melhor.
Em fevereiro publicamos um artigo mostrando o quanto a CPTM avançou e o quanto é injusto a empresa não receber uma nova chance diante das futuras concessões de suas linhas. Agora, com a publicação do relatório referente ao ano de 2019, tal avanço é, efetivamente, confirmado, e revela que a empresa pode crescer sim, operando as 7 linhas.
No ano em questão, além das melhoras operacionais, como o prolongamento do Expresso Leste até Mogi, o aumento de viagens na Linha 13-Jade e no Expresso Linha 10, renovação da frota em algumas linhas, retomada de algumas obras, entrega de trens novos e projetos voltados para a melhoria do serviço, algumas coisas que nos chamaram a atenção foram as relações internas.
Por meio de seu Instagram, Pedro Moro, presidente da estatal, mostrava as reuniões periódicas com os funcionários, sendo algumas delas realizadas nas bases operacionais, homenagens para alguns colaboradores que fizeram ações pontuais, pesquisa Gestores na Estação, ideias que poderiam melhorar o serviço prestado, transparência em muitas ações, além de uma divulgação e comunicação melhor para com os passageiros e até com os veículos de comunicação.
Além disso, os números divulgados mostram que os avanços e o novo modelo de gestão surtiram um efeito positivo, não sendo um puro marketing, estratégia comum do governador João Doria (PSDB). Confiram alguns desses dados a seguir logo abaixo:
A receita tarifária da CPTM teve uma grande elevação no ano de 2019, impulsionada, não só pelo reajuste tarifário de 7,5%, ocorrido em janeiro do referido ano, como também pelo crescimento do número de passageiros pagantes que atingiu 433,1 milhões no período, melhor performance desde o ano de 2015, superando em 4,8% ao registrado em 2018.
Os dados contábeis apontam que foram vendidas viagens atingindo o total de R$ 1.744,0 milhões, que inclui a receita do Expresso Turístico da ordem de R$ 595,3 mil, superando em 11,9% ao apurado em 2018.
É importante ressaltar, no entanto, que esse resultado está influenciado pelas perdas financeiras provenientes da operacionalização do Sistema de Bilhetagem Eletrônica (SBE), em virtude da modelagem dos contratos de concessão firmados pelo Governo do Estado com os Consórcios da Via Quatro e da Via Mobilidade que estabelecem tarifa de remuneração com base no número de passageiros transportados. Para 2019, exclusivamente para tais consórcios, foi apurado o montante de R$ 210,9 milhões, o que se constitui num impacto negativo de 12,1% na receita tarifária total gerada pela Companhia.
O trecho acima nada mais é do que o sistema da Câmara de Compensação proposto pelo Estado, que dá prioridade às duas concessionárias privadas e que continuará nas próximas concessões de linhas.
Além do desempenho acima, a CPTM avançou em outras áreas, sendo algumas delas:
- 867,7 milhões de passageiros transportados, contra 863,3 milhões no ano de 2018;
- 652 viagens realizadas, contra 894.005 no ano de 2018. Neste caso, não se trata de uma diminuição e sim na alteração, já que o Expresso Leste passou a ir direto para a Estação Estudantes;
- MKBF de 4.134 km, contra 3.914 km em 2018;
- Consumo de energia elétrica de tração de 494.850 MWh, contra 498.293 MWh no ano de 2018;
- Redução dos intervalos médios no pico manhã e pico tarde;
- Aumento do percentual no cumprimento de viagens e dos intervalos;
E no que tange aos aportes por meio do governo estadual, o Tesouro do Estado transferiu para a CPTM a quantia de R$ 929,8 milhões sendo R$ 597,0 milhões em forma de subvenção econômica para custeio das atividades e R$ 332,8 milhões como ressarcimento do valor das gratuidades concedidas.
Como se nota, a empresa cresceu e tem um potencial ainda maior, caso as diretrizes atuais não se alterem nos próximos três anos. Entretanto, no meio desse caminho haverá a concessão de 3 linhas da empresa e todo esse empenho e esforço poderá ser em vão, visto que algumas dessas linhas tem um peso importante dentro da infraestrutura da empresa.
O modelo de concessão feito pelo governo estadual precisa ser revisto, pois é muito cômodo e vago afirmar que as linhas 4-Amarela e 5-Lilás são boas e operam bem, sendo que elas possuem, digamos, regalias, que as empresas públicas não possuem. Como seria se a CPTM e o Metrô tivessem o mesmo tratamento que o Grupo CCR tem?
Muitos podem alegar que não mudaria muito, e até concordamos de certa forma, visto o tamanho da infraestrutura e a complexidade em operar as duas estatais, mas seria mais justo do que a forma como ocorre agora.
Se quiserem ter acesso ao Relatório Integrado da Administração do ano de 2019 completo, basta clicarem aqui.
Cuidado com as estatísticas. Bem usadas elas podem transformar resultados ruins em bons.
Vejamos a frota. Qual motivo explica a mudança de divulgação do MKBF?
Nos relatórios entre 2014 e 2018 a CPTM optou por apresentar o MKBF 1-2 (faixa onde ocorrem as falhas mais relevantes ou como a CPTM inttula, “as que causam prejuízos operacionais”). No relatório de 2019 foi divulgado apenas o MKBF geral (como era feito entre 2004 e 2013).
Avaliando os números (incompletos por conta do período 2014-2016), eis o MKBF geral da frota:
Ano/MKBF (km)
2004 – 2528
2005 – 2723
2006 – 2836
2007 – 2706
2008 – 3006
2009 – 3998
2010 – 3677
2011 – 3716
2012 – 3981
2013 – 3667
2017 – 3475
2018 – 3914
2019 – 4134
Fontes: Relatórios anuais da CPTM
Apenas pelos números de MKBF vemos que o de 2019 foi o melhor de todos. Porém quando descobrimos que a frota de trens da CPTM diminuiu de 213 trens em 2018 para 190 trens em 2019 fica fácil entender o motivo: menos trens=menos falhas.
A brusca redução de frota foi motivada por motivos eleitoreiros, onde 23 trens antigos/reformados foram retirados de serviço muito antes do fim de sua vida útil (de 25/30 anos). Trem é um equipamento caríssimo, por isso não deve ser aposentado antes da vida útil. Um trem (sem ser reformado) tem vida útil de 30 anos. Com uma reforma geral, pode rodar até por mais 30 anos. Nada explica aposentar a Série 1700 (reformada em 1999) e a maior parte da Série 2100 (reformada em 1998). Há alguns anos a CPTM apresentou um estudo dizendo que para as linhas dela terem intervalos de até 3 minutos na hora do rush seriam necessários 284 trens. Em 2012 a frota da CPTM era de 188 trens. Em 2019 era de 190. Ou seja, praticamente não houve evolução na frota. De que adiantam trens novos, melhores, mais econômicos, de melhor manutenção, etc, se eles são usados no limite por falta de frota?
Com menos frota, transporta-se mais passageiros por carro.quilômetros anuais. Os dados mostram isso. Em 2016 eram 188,3 milhões de carros.quilômetros anuais. Em 2019 foram 222,4 milhões de carros.quilômetros anuais.
A análise do todo indica que temos uma frota menor e que circula cada vez mais, transportando um número de passageiros cada vez maior. Assim, o número de falhas tende a crescer a médio/longo prazo.
Câmara de compensação não influi em nada nesse caso (de gestão de frota).
E sem frota não tem como fazer a empresa funcionar.
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