Trecho Norte do Rodoanel (Foto: Eduardo Saraiva/Governo do Estado de São Paulo)

O Rodoanel foi uma aposta do Governo do Estado como forma de aliviar o trânsito de São Paulo por conta dos caminhões que chegavam a cidade a partir das principais rodovias e eram obrigados a cruzá-la tendo como destino outras rodovias ou regiões conectadas pelas marginais. A proposta, era, então, que o Rodoanel fizesse com que os veículos circundassem a cidade deixando as vias mais livres.

Sendo assim, em 1998, o governador Mário Covas (PSDB) lançou o edital do primeiro trecho, no caso o Oeste. Esse trecho partiria da Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, no bairro de Perus e ligaria as rodovias dos Bandeirantes, Anhanguera, Castelo Branco, Raposo Tavares e Régis Bittencourt. Com 32 km de extensão foi inaugurado no ano de 2002.

As obras do segundo trecho, tiveram início em 2006. O trecho sul continuou a partir do Oeste, nas proximidades da Rodovia Régis Bittencourt, passando por regiões de proteção de mananciais, como a Represa Billings e conectando as rodovias dos Imigrantes e Anchieta. Há também uma saída para a Avenida Jacu Pêssego. Foi inaugurado em 2010 com 57 km de extensão.

O trecho Leste começou a ser construído em 2011 e foi entregue, totalmente, em 2015. Começa a partir do trecho Sul e passa pelos municípios de Ribeirão Pires, Mauá, Suzano, Poá, e Itaquaquecetuba, interligando as rodovias Presidente Dutra e Ayrton Senna. Possui 43,5 km de extensão. Esse trecho foi construído integralmente pela iniciativa privada, já que essa era uma das condições da concessão do trecho Sul, vencida pela SPMar.

O trecho Norte, com as obras iniciadas em 2013, está com as obras paradas. Terá 44 km e vai fechar o arco dos outros trechos, interligando as rodovias Presidente Dutra e Fernão Dias.

O Trecho Norte

As obras do trecho norte do Rodoanel Mário Covas estão paralisadas desde o ano de 2018. A última previsão de inauguração era para o ano de 2016, ou seja, já está com 5 anos de atraso.

Segundo uma apresentação da Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) mostrada na audiência pública no finalzinho do mês passado, o empreendimento está divido em seis lotes.

O Lote 1 está com 74% das obras executadas, o Lote 2 com 91%, o Lote 3 com 80%, o Lote 4 com 94%, o Lote 5 com 97% e o Lote 6 com 75%. Percebam que não há nenhum lote, efetivamente, concluído, o que mostra o relaxo e a falta de sinergia por parte do governo estadual na condução da obra.

Até o momento, a ideia era o governo construir a obra, por meio da Desenvolvimento Rodoviário (Dersa), empresa estatal que está em liquidação, e depois fazer uma concessão, assim como ocorreu nos trecho oeste e sul. Agora, segundo a Artesp, o modelo será outro.

De acordo com a agência, no novo modelo, a empresa vencedora do certame se encarregará de concluir a obra sem receber nenhum aporte do governo estadual. Entretanto, terá o direito de explorar o trecho pelo prazo de concessão de 30 anos, por meio das receitas oriundas dos pedágios.

Falando em pedágios, serão 4 a serem construídos, sendo duas praças de barreira, localizadas na região da Rodovia Presidente Dutra e na Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, e duas praças de saída, na região da Rodovia Fernão Dias. A cobrança só poderá ser feita a partir do 25º mês da concessão, o que significa, 2 anos após a assinatura do contrato. Considerando o prazo para a retomada das obras, a cobrança se dará por volta de 2024.

O valor estimado para concluir a obra é de R$ 2,4 bilhões (Capex – Capital Expenditure). Para a operação é estipulado um valor de R$ 1,5 bilhão (Opex – Operational Expenditure).

Bem, agora que replicamos as informações disponibilizadas, vamos para uma breve análise do Plamurb.

O modelo adotado (construir e operar) implica alguns problemas. A empresa que vencer a licitação, terá que concluir a obra e poderá fazer a exploração do local por meio dos pedágios. Em outras palavras, nos 30 anos, ela deverá recuperar tudo o que foi gasto e ainda por cima ter seu retorno financeiro cobrando os pedágios. Por esta razão, o valor ou o modelo de cobrança deverá ser muito bem estudado. Se for um valor muito alto, pode não atrair os caminhões, por exemplo, que poderão continuar usando as marginais, mesmo gastando um tempo maior. Se for muito baixo, porém, a concessionária pode não ter o seu retorno financeiro, podendo comprometer a manutenção e operação da estrutura.

A título de comparação, o trecho oeste foi construído pelo Estado e depois concedido. Neste caso, as receitas dos pedágios foram usadas, basicamente para a manutenção do espaço. No trecho sul, a mesma coisa, com a diferença de que a empresa vencedora teria, como obrigação, construir o trecho leste. Entretanto, com a possibilidade de cobrança no trecho sul, digamos que o custo de implantação do trecho leste não impactou tanto do ponto de vista econômico-financeiro.

Como podem ver, o modelo de concessão do trecho norte foge do modelo dos outros três trechos e aí que o blog alerta.

Em algumas rodovias, isso é evidente. Aquelas com pedágios muito baixos deixam a desejar na manutenção e serviço prestado. Aquelas com valores muito alto, vê o número veículos aquém do estimado, sendo que muitos desviam por rotas não pedagiadas.

É importantíssimo estudar de forma minuciosa o modelo de cobrança, bem como os valores cobrados, porque qualquer erro pode colocar em xeque a viabilidade da concessão. Em uma situação mais drástica, a concessionária poderá solicitar um reequilíbrio por parte do poder concedente (governo) ou reajustes altos, que levará aos problemas citados acima. De um jeito ou de outro o dinheiro sairá dos nossos bolsos, dinheiro esse que poderia ser usado em mais linhas metroferroviárias ou corredores metropolitanos, por exemplo.

Como já escrevemos em um artigo mais antigo, por conta dos diversos atrasos, o Rodoanel, hoje, é uma obra praticamente obsoleta, considerando o que se previa com sua construção. A não conclusão do trecho norte forçou a prefeitura de São Paulo a criar ações errôneas e retrogradas, como a inútil pista central da Marginal Tietê, que só se mostrou eficiente nos primeiros meses após sua inauguração, e ainda assim, com muitas ressalvas.

A obsolência do Rodoanel é reforçada, por exemplo, pelo anúncio, tempos atrás, do Macroanel Paulista, uma espécie de rodoanel com diâmetro maior, e que também pretende tirar caminhões e outros tipos de veículos dos centros urbanos.

Se o Rodoanel tivesse sido implementado décadas atrás, talvez ele tivesse ajudado a reordenar a mancha urbana da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Ou seja, muitos gargalos não existiriam nos dias de hoje. Algumas obras que foram executadas pensando no alívio do trânsito, não seriam necessárias e todo esse investimento poderia ter sido direcionado para o transporte público.

De uma maneira geral, o governo está gastando uma fortuna para apenas enxugar gelo. A obra que começou em 1998 ainda não foi completamente finalizada. Naquela época as necessidades e a dinâmica de circulação eram diferentes dos dias atuais.

Hoje, pensando em sustentabilidade, a matriz energética para o transporte de cargas, precisa ser diversificada. Sendo assim, onde está o ferroanel ou a segregação dos trilhos desobstruindo as linhas da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM)? Falando em ferroanel, muito se falou sobre o faixa construtiva do trecho norte do Rodoanel, dispor de algum espaço para a implantação dos trilhos.

Mais uma vez estamos caminhando para um retrocesso rodoviário.