Trem emprestado para a ViaMobilidade (Foto: Thiago Silva)

No contrato de concessão das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) foi obrigada a ceder alguns trens, provisoriamente, para a concessionária, até o momento em que ela adquirisse suas próprias composições. Sendo assim, foram emprestados alguns trens da série 8500, da série 7500 e todos da série 7000. Alguns deles ficarão em definitivo com a vencedora do leilão, no caso da ViaMobilidade. Porém, parte da frota será devolvida para a estatal. Os problemas começam aí.

De acordo com o cronograma que consta no Edital, a ViaMobilidade começaria a devolver os trens da CPTM a partir do 23º mês após a assinatura do contrato. Como esse fato ocorreu em 30 de junho de 2021, a operadora privada deveria ter começado a devolver os dois primeiros trens a partir de maio desse ano, fato que ainda não aconteceu. Pela ordem os primeiros trens a serem devolvidos são os 7 trens da série 8500, seguidos dos 8 trens da série 7500 e mais 19 trens da série 7000.

Uma das obrigações contratuais da nova operadora das linhas 8 e 9 é a aquisição de novo material rodante. A empresa, então adquiriu 34 trens junto à fabricante Alstom. O cronograma está atrasadíssimo e, por esta razão, a devolução para a CPTM ainda não aconteceu. Como já estamos no mês de dezembro, eram para ter sido devolvidos 19 trens, o que englobaria todos os trens da série 8500, 7500 e mais quatro trens da série 7000.

Cronograma de devolução (Foto: Edital de concessão/Governo do Estado de São Paulo)

Até agora, porém, além da não devolução, nada sobre a aplicação das multas. A própria Secretaria de Parcerias em Investimentos (SPI), aparentemente está em inércia quanto a isso, pois levando em conta o tratamento dado pelo governo paulista à ViaMobilidade, parecem não ter nenhum interesse em cobrar as multas. Porém, para que não fiquemos com achismos, entramos em contato com o governo por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) fazendo quatro perguntas sobre quando os trens serão devolvidos, a aplicação das multas, se a CPTM seria ressarcida na devolução e sobre o estado de conservação. Inacreditavelmente, a SPI deu uma resposta bem genérica, solicitando para que olhássemos o referido anexo e que sim, a concessionária está sujeita à aplicação de multas. Como a resposta ficou muito aquém do esperávamos, entramos com um recurso, cobrando respostas mais claras.

Depois de muito aguardar, recebemos novo retorno, porém ainda insuficiente. Na prática eles insinuavam para que a gente olhasse no Edital para tirar as dúvidas, além de não responder com firmeza, se serão ou não aplicadas as multas. Vejam algumas das respostas:

“…informamos que há um cronograma estabelecido no contrato de concessão para devolução dos trens em correspondência com as datas de entrega dos novos trens, e que os trens serão devolvidos à CPTM de forma a assegurar a continuidade e adequação da operação das Linhas 8 e 9, garantindo a continuidade e qualidade do serviço concedido…”

A resposta acima reforça que estão mais preocupados com a operação das linhas 8 e 9 do que com o rigoroso respeito à devolução dos trens. Que existe um cronograma, todos nós sabemos, mas ele não está sendo cumprido. Por essa razão que questionamos. A título de curiosidade, o item 5.5.4 do Anexo II-G diz que a concessionária deve cumprir, impreterivelmente, independentemente da entrada em operação dos novos trens adquiridos, a Programação de Devolução de Trens, compreendendo, integralmente, a ordem, quantidades e prazos.

Trecho do Edital de concessão (Foto: Edital de concessão/ Governo do Estado de São Paulo)

Logo a seguir, segue mais outra resposta após questionarmos junto à LAI:

“…De acordo com o Anexo II.F, do Contrato, no período em que a Concessionária estiver operando com os trens cedidos pela CPTM, será também responsável pela manutenção destes trens, devendo obedecer aos manuais e planos de manutenção disponibilizados, inclusive, há previsão de que deverão ser devolvidos com os mesmos equipamentos (rádios) instalados e operacionais. Por fim, nos termos do Anexo II.G, os trens deverão ser devolvidos no mesmo estado de conservação de quando foram entregues, com todas as manutenções previstas realizadas, situação que será devidamente certificada pelo AUDITOR INDEPENDENTE com acompanhamento da CPTM e da CONCESSIONÁRIA.

Nos termos do item 111, da Tabela de Infrações do Anexo V do Contrato, o não atendimento ao relatório emitido pelo Auditor Independente, quando este relatar a permanência de avarias apontadas no laudo de verificação para devolução dos trens da frota cedida pela CPTM, sujeita a Concessionária à penalidade de multa…”

Novamente a resposta deixa a desejar, pois o descrito está no contrato, portanto, nada que já não seja sabido.

Quantos trens já deveriam ter sido devolvidos e qual o valor da multa?

Como já descrito no começo desse artigo, até o momento deveriam ter sido devolvidos 19 trens, correspondendo aos meses de maio a novembro.

Nos dois primeiros meses do cronograma, devem ser devolvidos 2 trens. A partir do terceiro mês, devem ser devolvidos 3 três por vez e assim por diante, até a devolução completa. As devoluções serão (ou seriam) entre o 23º mês até o 34º mês após a assinatura do contrato de concessão. Como fechamos o mês de novembro, estamos no 29º mês de devolução.

Multas por não devolução (Foto: Edital de concessão/Governo do Estado de São Paulo)

No Anexo V do Edital, em seu item 9, consta que a concessionária deve receber multas de R$ 500.000,00 por trem no primeiro mês de atraso, e de R$ 1.000.000,00 do segundo mês em diante. Dentro de nosso entendimento, consideramos os R$ 500 mil para o primeiro mês de atraso na devolução de cada grupo de trens, portanto, fizemos o cálculo em cima disso. Confiram a tabela abaixo:

Tabela com os valores das multas (Foto: Thiago Silva)

Como se viu, até o momento, as multas por atraso na devolução dos trens somam cerca de R$ 61,5 milhões. E à medida que os meses vão passando, o valor aumenta, pois ele vai se acumulando.

Além disso, há a possibilidade da aplicação de multas caso a situação do trem devolvido não atenda ao relatório emitido pelo Auditor Independente, quando este apontar a permanência de avarias apontadas no laudo de verificação de devolução. Neste caso o valor da multa é de R$ 80 mil por trem, até que esteja em condições de ser aceito pela CPTM.

Se isso será pago? Duvidamos. A gestão Tarcísio está sendo muito benevolente com relação à ViaMobilidade e demais concessionárias privadas, indo contra tudo aquilo que pregou durante a campanha política. Em todo caso, que fique aqui registrado.

Por outro lado, quando se trata de pagar indenizações por atrasos nas obras ou por queda demanda, o governo reconhece na hora.