Trens operando na Linha 8-Diamante (Foto: Thiago Silva)

Após a Audiência Pública realizada no dia 27 de fevereiro de 2020, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) abriu Consulta Pública para maiores esclarecimentos sobre a concessão das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda.

Os documentos foram disponibilizados no site do governo e, desde essa data, é possível enviar críticas, sugestões, questionamentos e etc. O Plamurb baixou todos os documentos disponíveis e fez uma breve análise. Deixamos claro que sempre nos colocamos contra essa concessão, e depois de analisar os arquivos, nossa posição contrária foi intensificada, tamanha é a fragilidade das exigências.

Antes de mais nada, porém, ano passado escrevemos um artigo mostrando como a CPTM ficará após essas duas linhas serem concedidas, detalhando informações do ponto de vista estrutural, financeiro e urbano. Você pode ler clicando aqui. Agora vamos ao que interessa.

A concorrência será internacional e o vencedor será aquele que ofertar o maior valor de outorga fixa no momento do leilão. A nova empresa será remunerada por meio de uma tarifa técnica contratual em relação aos passageiros transportados. A tarifa técnica é diferente da tarifa pública, que é aquela que a gente paga ao acessar o sistema. Ela pode ser maior ou menor.

A seguir, vamos detalhar algumas exigências:

Estações

Nos documentos da consulta pública, consta que das 40 estações que compõe a concessão, pelo menos 38 delas passarão por algum tipo de intervenção, variando de reformas para ampliações e até reconstruções. Vale ressaltar, porém, que muitas dessas estações já são acessíveis e foram construídas ou modernizadas recentemente. Neste caso, fica claro que estão priorizando uma região onde as estações já estão em uma situação melhor.

Tipo de intervenção nas estações (Foto: GESP/STM)

Ao anunciar o grande número de estações que serão reformadas, o governo quer passar uma imagem ou ideia de que muito deverá ser cobrado da concessionária, mas com uma breve análise, nota-se que estão apresentando números altos apenas.

Na prática, as estações que realmente precisam de grandes intervenções urgentemente são a Lapa, Imperatriz Leopoldina, Comandante Sampaio, General Miguel Costa, Santa Terezinha, Antônio João e Sagrado Coração, ou seja, das 38, apenas 7 delas precisam de intervenções o quanto antes.

Até mesmo a reconstrução da Estação Ambuitá, que em um primeiro momento pode ter um impacto positivo, não passa de uma falácia, já que a referida parada, será de pequeno porte, assim como Santa Rita e Amador Bueno.

No caso da Estação Lapa, haverá a tão esperada e necessária unificação, ou seja, a Lapa da Linha 8-Diamante e da Linha 7-Rubi serão apenas uma parada apenas com integração entre as duas linhas.

Unificação das estações da Lapa (Foto: GESP/STM)

Na apresentação disponibilizada é citado que um dos “benefícios da concessão” é que haverá o acréscimo de 5 novas estações, porém, 3 delas já estão em construção, no caso João Dias, Mendes-Vila Natal e Varginha.

Os prazos para as intervenções nas estações, segundo o documento, variam de 12 a 72 meses, ou seja, 1 ano até 6 anos. Em outras palavras, se a iniciativa privada não falhar, caso o contrato seja assinado em 2020, em 2026 todas as obras deverão ter sido concluídas. Sendo assim, na segunda metade da próxima década, as duas linhas estarão em um nível nunca antes visto na história. Vamos ver.

Por outro lado, estações em péssima situação, como Aracaré, Ipiranga, Mooca, Eng. Manoel Feio, Braz Cubas, Guapituba e etc., continuarão oferecendo um serviço ruim aos passageiros. Se a proposta é melhorar o serviço, por que não fazer uma contrapartida diferente? Por exemplo, em vez da concessionária modernizar ou reformar suas estações, poderia reformar aquelas que continuarão com a CPTM, visto que as outras estão em situação melhor e poderiam aguardar por mais um tempo uma eventual reforma? Chega a ser imoral cobrar melhorias em estações que já estão boas, enquanto há estações em situação ruim.

Frota

Segundo o documento, a nova concessionária terá que comprar 30 trens e realizar a remobilização de 2 trens que se encontram parados. Enquanto ela não recebe seus próprios trens, ela ficará com a frota da CPTM. No caso dos trens da Série 8000, eles continuarão com a CPTM e serão remanejados para as linhas remanescentes da estatal.

A nova empresa ficará com os trens da Série 7000 além dos trens da Série 5400, que hoje atendem a extensão entre Itapevi e Amador Bueno. Entretanto, a CPTM emprestará cerca de 15 trens da Série 8500, ou seja, vão desfalcar a Linha 11-Coral que atualmente opera com esses trens. Evidentemente que a CPTM colocará outros trens no lugar, mas soa muito estranho ceder uma das frotas mais novas. Sendo assim, a frota da nova empresa será composta de 40 trens da Série 7000, 15 trens da Série 8500 e 6 trens da Série 5400.

O documento ainda diz que passado o prazo máximo de 30 meses da assinatura do contrato de concessão, a concessionária deverá devolver impreterivelmente para a CPTM todos os 15 trens da Série 8500, além de mais 15 trens da Série 7000, independentemente da entrada em operação de seus próprios trens. Isso significa que em 2 anos e meio, a nova empresa deverá estar com todos os seus trens em plena operação. É um prazo até meio apertado, mas considerando que uma empresa privada não precisa fazer licitação, está de bom tamanho, até porque ela pode usar das especificações técnicas dos últimos modelos adquiridos pela CPTM, o que agilizará o processo. Os outros 25 trens da Série 7000 continuarão com a concessionária.

Novos trens da concessionária (Foto: GESP/STM)

Máquinas e equipamentos também serão fornecidos para a concessionária, porém, ela, em contrapartida, terá que adquirir novos equipamentos para a CPTM que serão usados no novo pátio de manutenção da estatal.

Novos serviços

A concessão mostra também que é simples e sem contrapartidas vultosas de verdade. A maioria dos serviços e intervenções que serão cobradas da concessionária poderiam ser executadas tranquilamente pela CPTM.

Nada se fala, por exemplo, do trem regional para Sorocaba, o Expresso Oeste-Sul e da ligação para a Alphaville, que são obras importantes, caras e, de certa forma, fogem da capacidade da CPTM ou do governo estadual. Essas deveriam ser as primeiras exigências de uma concessão desse tipo, pois deve pensar na criação de ligações e serviços novos e não apenas no puro e simples repasse do atual serviço para a iniciativa privada.

E podem ter certeza de que se não colocarem isso no Edital, dificilmente esses novos serviços sairão do papel durante o prazo de concessão, sem, ao menos, um reequilíbrio financeiro ou aumento do prazo de concessão.

Prazo de concessão

O prazo de concessão será de 30 anos, ou seja, caso o Edital seja lançado ainda esse ano, é provável que os contratos sejam assinados ano que vem, em 2021. Por essa razão, a nova empresa operará as duas linhas até 2051.

Particularmente achamos o prazo longo, pois mesmo com as intervenções previstas, com exceção da compra dos novos trens, os recursos gastos podem ter o retorno em pouco tempo, embora se trate de um serviço público. A título de curiosidade, o prazo de concessão das linhas 5-Lilás e 17-Ouro é 20 anos.

Novo Centro de Controle e Pátio de Altino

A concessionária privada ficará com o Pátio de Presidente Altino. Ela terá a obrigação de implantar um novo Centro de Controle Operacional (CCO) no local. Além disso, ela deverá construir, para a CPTM, novos prédios que abrigarão as atividades que hoje são executadas no local, já que a estatal não poderá mais usar o Pátio de Altino. A CPTM indicará o melhor local para que seja construído.

Isso mostra que a concessão está sendo feita de modo a sair do papel em qualquer circunstância, já que o fato de terem que construir novos prédios para abrigar as atividades da CPTM nas linhas remanescestes é um claro sinal de solução improvisada, um remendo. Em outras palavras, tem-se a sensação de que estão “comprimindo” a empresa, até porque, outra linha da estatal será concedida futuramente, no caso a Linha 7-Rubi, e se essa regra for mantida, provavelmente vão solicitar a construção de outra edificação para abrigar as atividades que hoje são realizadas no Pátio da Lapa, exceto se forem aproveitar nos novos prédios que serão construídos pela concessionária das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda.

Sinalização e energia

A nova empresa terá que modernizar o sistema de sinalização para que haja a redução do intervalo entre as composições. Não fica claro, porém, se a concessionária terá que implantar o CBTC ou reduzir o intervalo com a sinalização atual.

Além disso terá que realizar obras de repotencialização nas duas linhas, até porque haverá mais trens circulando pelo fato de que se pretende reduzir os intervalos.

Transposições no Rio Pinheiros

Uma novidade nessa audiência pública é a obrigação de construir transposições sobre o Rio Pinheiros, ligando as duas margens. Essas transposições deverão ser implantadas nas estações Ceasa e Jurubatuba da Linha 9-Esmeralda.

Transposição do Rio Pinheiros (Foto: GESP/STM)

Além disso está previsto a erradicação de todas as passagens nível das duas linhas. No lugar serão construídas passarelas.

Plano de Demissão Voluntária (PDV)

Como era de se esperar, haverá um PDV. Segundo a apresentação, esse PDV deverá ser implantado até onde a outorga suportar, ou seja, esse valor não será usado na melhoria da própria CPTM e sim para bancar as verbas rescisórias dos funcionários que optarem por serem demitidos.

É uma situação complicada, pois se as verbas rescisórias dos funcionários que aderirem ao PDV ficar acima do valor da outorga, o funcionário continuará na empresa ou ele será demitido fazendo uso de verba do tesouro estadual.

Por outro lado, reforçamos que esses recursos deveriam ser usados em investimento na própria CPTM, como por exemplo, prover a acessibilidade em estações que hoje não são.

Conclusão Plamurb

A concessão não nos agrada de forma alguma. O governo estadual quer passar uma imagem de grandiosidade nesse processo, mas tudo está muito aquém daquilo que entendemos como sendo o mínimo aceitável em um processo de concessão desse porte.

Entendemos que uma concessão seja a última alternativa para se melhorar um serviço público e a CPTM chegou no patamar em que está hoje em decorrência de investimentos públicos.

O maior problema da RMSP é a falta de uma ampla e não, necessariamente, o operador. Portanto, a partir do momento que se decida conceder duas linhas, sem exigir novos serviços, como aqueles citados mais acima, fica claro que o governo quer apenas repassar para a iniciativa privada em uma tentativa de aceno ao mercado, mesmo que, para isso, haja prejuízo ao erário estadual.