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Ônibus em terminal de São Paulo (Foto: Jovem Pan On Line)

Antes de mais nada é preciso esclarecer que no transporte público, sistemas sobre pneus e sobre trilhos não competem um com o outro. Eles se complementam, e em casos de falhas, um ajuda o outro. Aqui em São Paulo é muito comum se acionar o sistema de ônibus, quando há falhas em linhas da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) ou da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). O Plano de Apoio entre Empresas em Situações de Emergência (PAESE) é acionado em muitas ocasiões. O inverso também acontece, principalmente, quando ocorrer greves no sistema de ônibus. Neste caso, algumas linhas sobre trilhos são prolongadas ou operam com estratégias operacionais. De uma maneira geral, não se pode pensar em mobilidade urbana nas grandes cidades apenas utilizando trilhos ou pneu.

Voltando a São Paulo, temos bons exemplos de linhas de ônibus que trafegam paralelamente a linhas sobre trilhos, não por concorrência e sim por complementação ou para desafogar as linhas saturadas. Podemos citar a 4310/10 – Estação de Transferência Itaquera /Term. Pq. Dom Pedro II, que margeia parte da Linha 3-Vermelha do Metrô e da Linha 11-Coral da CPTM, a linha 175T/10 – Metrô Santana / Metrô Jabaquara, que trafega paralelamente a Linha 1-Azul e até mesmo a linha 8700/10 – Terminal Campo Limpo / Praça Ramos que percorre parte do trajeto da Linha 4-Amarela. Futuramente, com a conclusão de novas linhas sobre trilhos, mais linhas de ônibus percorrerão parte do trajeto também. E isso é perfeitamente sadio, já que dá mais opções de deslocamento aos usuários, além da possibilidade de mais pontos de parada, já que a distância dos pontos de ônibus é, geralmente, menos da metade de uma estação do Metrô.

Como é possível perceber, o sistema de ônibus de São Paulo é e sempre será extremamente importante. Para quem não sabe, a cidade possui a maior frota de transporte público do mundo. São 14.406 veículos, segundo dados do mês de setembro retirados da página da São Paulo Transporte (SPTrans). Desses, 8451 são do sistema estrutural e 5955 do sistema local. Todos esses veículos circulam nas 1342 linhas em operação na cidade. São número expressivos e que evidenciam a imensidão do sistema. Sendo assim, é muito comum observar prefeitos, vereadores e secretários de áreas voltadas para a mobilidade urbana dizerem, com orgulho, que São Paulo tem a maior frota de transporte público por ônibus do mundo. Mas, infelizmente, isso não é motivo de orgulho. O orgulho seria no contexto da complexidade de se gerir uma frota tão grande, porém, no contexto de mobilidade urbana, ratificamos, não é motivo de orgulho. E vamos explicar o porquê.

O tamanho de uma frota de ônibus de uma grande cidade é inversamente proporcional ao tamanho da malha sobre trilhos, ou seja, se tem muito ônibus é porque falta linhas de transporte sobre trilhos. E em São Paulo, essa realidade é perfeitamente notável. Temos o maior sistema de transporte por ônibus do mundo, justamente porque há um déficit de linhas metroferroviárias. Dentro da cidade temos hoje cerca de 81 km de trilhos do Metrô e mais 134 km de trilhos da CPTM, totalizando 215 km de trilhos, um número muito aquém das necessidades de deslocamento do paulistano, ainda mais se levarmos em conta o tamanho da cidade e o velho problema da distância casa/emprego. E como a expansão de linhas sobre trilhos caminha a passos vagarosos, cabe ao sistema de ônibus suprir essa lacuna deixada pelas linhas metroferroviárias. Assim sendo, temos muitos quilômetros de corredores e faixas exclusivas que melhoram a fluidez na circulação dos ônibus, além das centenas de linhas que rodam em vias comuns. Parte dessas linhas são conectadas ao sistema sobre trilhos, dando maior agilidade ao deslocamento. Aliás, podem ter certeza de que se nossa malha sobre trilhos fosse maior, nosso sistema de ônibus seria proporcionalmente menor. Nas grandes cidades do mundo é assim. As linhas de metrô são bem distribuídas, espalhadas e com muitos quilômetros, de tal forma, que o sistema de ônibus fica reduzido às regiões onde os trilhos não chegam ou apenas como complemento. Futuramente, aliás, bem futuramente, em São Paulo, quando tivermos uma malha maior, as linhas e a frota de ônibus serão reduzidas e aí sim será um motivo de orgulho, já que os coletivos sobre pneus darão lugar aos trilhos.

Mas calma que o sistema de ônibus não está fadado a desaparecer. Aliás, isso é impossível. Os ônibus continuarão a circular. Infelizmente não teremos estações em todos os cantos da cidade. Caberá aos ônibus proverem mobilidade nesses locais. Como já dissemos acima, nas grandes cidades do mundo, como Nova York, Paris, Londres e Tóquio, a malha sobre trilhos é extensa, mas o sistema de ônibus está lá presente, em menor quantidade, complementando e garantindo a mobilidade dos cidadãos.

Há ainda mais outro aspecto que pode reduzir a participação do sistema de ônibus: as bicicletas. Hoje em dia, felizmente, com a implantação de muitos quilômetros de ciclovias e a implantação de bicicletários em estações e terminais de ônibus, aquele usuário que se utilizava dos coletivos em pequenas distâncias, agora usa a sua bicicleta, deixando apenas os trajetos maiores para os ônibus ou trilhos. É uma boa tendência. Indo mais além, o aumento da malha sobre trilhos, felizmente, vai significar menos carros nas ruas e isso terá um grande peso a favor da mobilidade urbana.

Nós elaboramos um mapa contendo toda a malha sobre trilhos dentro da cidade de São Paulo. Considerando que a maioria das pessoas topem caminhar até 1km para acessar alguma estação, destacamos todas as áreas “vazias”, ou seja, não servidas por alguma estação metroferroviária. Claro que dentro de boa parte dessas áreas, há corredores de ônibus que suprem, de forma superficial, mas o foco dessa publicação é mostrar como a ausência de trilhos, aumenta a presença de ônibus. Também respeitamos as áreas verdes e de proteção ambiental. Acompanhem abaixo.

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Mapa com a malha sobre trilhos da cidade e as “áreas vazias” (Foto/confecção: Thiago Silva)

Percebam que as zona norte e leste, principalmente, são as regiões que mais sofrem com a ausência de linhas metroferroviárias. Na zona norte, temos uma área de 83,8 km² entre a Linha 1-Azul e Linha 7-Rubi e abaixo da Serra da Cantareira. Nesse local, há dois corredores, o que vai a Pirituba e para a Cachoeirinha. Futuramente, nessa região, haverá três novas linhas do Metrô, no caso a Linha 6-Laranja (Brasilândia – São Joaquim), Linha 16-Violeta (Cachoeirinha-Ipiranga), além da Linha 23-Magenta Arco Norte (ligando a região da Lapa às proximidades de Guarulhos).

Ainda na zona norte, temos uma área de 50,8 km² a leste da Linha 1-Azul e a oeste da divisa com Guarulhos. Futuramente essa região terá a Linha 19-Celeste (Guarulhos-Campo Belo).

Já na zona leste, temos duas áreas vazias, uma com 74,5 km² entre a Linha 11-Coral e Linha 12-Safira. No local, futuramente, estão previstos o corredor Celso Garcia, a Linha 21-Grafite (Pari-Nordestina) e a Linha 14-Ônix (Guarulhos – ABC).

A outra área vazia tem 169 km² e fica ao sul da Avenida Radial Leste até a divisa com os municípios de Santo André e Mauá. No local está previsto o prolongamento da Linha 15-Prata, que atualmente circula entre Via Prudente e Oratório. Futuramente chegará até Cidade Tiradentes. A própria Linha 14-Ônix também irá passar por essa região. Também consta o prolongamento da Linha 6-Laranja a partir de São Joaquim até Cidade Líder.

E por fim, temos parte da zona sul com 73,7 km² de área vazia. No local, compreendido entre a Linha 9-Esmeralda e Linha 1-Azul, porém, está previsto a conclusão da extensão da Linha 5-Lilás, a Linha 17-Ouro do monotrilho, e as futuras linhas 20-Rosa (Lapa-Moema) e 19-Celeste.

Infelizmente todos os projetos citados acima provavelmente demorarão muito, mas muito mesmo a sair do papel. Algumas linhas poderão ser excluídas ou ter o traçado alterado. A dependência exclusiva por ônibus continuará nessas regiões.

Apenas por curiosidade, abaixo, seguem os mapas de quatro sistemas sobre trilhos em quatro grandes cidades do mundo. Embora os mapas não estejam em escala, é possível perceber como as linhas cobrem boa parte da cidade, fazendo que os espaços vazios sejam muito menores que a cidade de São Paulo. E é justamente por isso que a frota de ônibus também é menor.

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Mapa do Metrô de Nova York (Foto: MTA)
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Mapa do Metrô de Londres (Foto: Wikipédia)
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Mapa do Metrô de Paris (Foto: RATP)
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Mapa do Metrô de Tóquio (Foto: Wikipédia)

Abaixo, segue uma pequena tabela com dados de algumas cidades do mundo e seus sistemas sobre trilhos e pneus. Por conta da dificuldade de achar dados precisos, algumas números podem sofrer pequenas variações.

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Dados de algumas cidades do mundo (Foto: Thiago Silva)